Como Formar um Leitor?

Existe coisa mais divertida que ler? Magia, fantasia e imaginação são apenas alguns dos elementos presentes nesses momentos, muitas vezes inesquecíveis. Porque então, as escolas formam tão poucos leitores e o gosto pelos livros ainda é uma raridade em nosso país?







Qual o contexto desse problema?

Os estudos apontam que o vilão dessa história é sempre o mesmo: misturar a literatura com atividades didáticas. Com razão, os estudantes não gostam quando precisam fazer resumos ou preencher fichas após a leitura de um texto.
Afinal, se a leitura deve provocar prazer e fruição, não há sentido em exigir tarefas que não tenham relação com isso. Estimular as múltiplas interpretações dos alunos privilegiando a construção de sentidos para os textos, estabelecendo relações com a realidade dos alunos e seus conhecimentos prévios e promovendo a construção de seu conhecimento por meio de atividades problematizadoras, deveria ser o objetivo da leitura.















O que dizem os especialistas?


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Doze maneiras simples de tornar difícil a aprendizagem da leitura (artigo publicado em I’Éducacion, 22 de maio de 1980)


1. estabeleça como meta o domínio precoce das regras de leitura.


2. cuide bem para que a fonética seja aprendida e utilizada


3. ensine as letras ou palavras, uma a uma, certificando-se de que cada letra ou palavra foi assimilada antes de passar para a seguinte


4. defina, como objetivo principal, uma leitura palavra-por-palavra perfeita


5. não deixe as crianças adivinharem; pelo contrario, exija que leiam com atenção


6. procure evitar, de todas as maneiras, que as crianças errem


7. dê um feedback imediato


8. detecte e corrija os movimentos incorretos dos olhos


9. identifique os eventuais disléxicos e trate-os o mais cedo possível


10. esforce-se para que as crianças apreendam a importância da leitura e a gravidade do fracasso


11. aproveite as aulas de leitura para melhorar a ortografia e a expressão escrita; insista também em que os alunos falem a melhor língua possível


12. se o método utilizado não lhe satisfazer, tente outro. Esteja sempre alerta, para achar material novo e técnicas novas


(Foucambert, 1994, p.13)


Direitos imprescindíveis do leitor:


1. o direito de não ler


2. o direito de pular paginas


3. o direito de não terminar um livro


4. o direito de reler


5. o direito de ler qualquer coisa


6. o direito de bovarismo


7. o direito de em qualquer lugar.


8. o direito de ler uma frase aqui e outra ali


9. o direito de ler em voz alta


10. o direito de calar


(Pennac, 1997, p.139)


Os textos de Foucambert e Pennac retratam a dicotomia da realidade presente nas escolas, revelando duas concepções de leitura:


Reduzida: que na leitura de um texto privilegia a decodificação dos símbolos gráficos, a compreensão das palavras e expressões e, logo, seu sentido mais imediato.


Ampliada: que na leitura de um texto privilegia os múltiplos sentidos presentes neste, as condições em que este foi produzido, sejam internas, sejam internas.


Tal concepção reduzida é a que tem causado alem de outros fatores a problemática na formação do leitor, pois


“A iniciação da leitura transcende o ato simples de apresentar ao sujeito as letras que ai estão já escritas. È mais que preparar o leitor para a decifração das artimanhas de uma sociedade que pretende também consumi-lo. É mais do que a incorporação de um saber frio, astutamente construído. (...) Fundamental, ao pretender ensinar a leitura, é convocar o homem para tomar da sua palavra. (Queiros, 1999, p.24)


E é este tipo de leitura o mais prejudicado no ambiente escolar devido às próprias distorções existentes no nosso sistema de ensino. Ao invés do prazer, levantam-se o autoritarismo da obrigação, do tempo predeterminado para a leitura, da ficha de leitura, da interpretação prefixada a ser convergentemente reproduzida (como se isso fosse possível!) pelo aluno-leitor e outros mecanismos que levam ao desgosto pela leitura e à morte paulatina dos leitores (...) (Silva. 1986)


Vale lembrar que perceber o múltiplos sentidos do texto depende da visão social de mundo de cada um. Segundo Abreu:


“Diferentes leitores, espectadores, ouvintes, produzem apropriações inventivas – e diferenciadas – dos textos que recebem.... (o leitor), pois ele esta submetido a restrições e limites impostos por sua formação cultural e pela forma particular do texto que lê. (2000, PP.123-124)


Além, da concepção adotada, quais outros fatores influenciam na formaçao do leitor?


• Muitos alunos por pertencerem a uma classe social desprivilegiada social e economicamente são privadas de bens culturais, ou seja, tem dificuldades de aquisição de livros, participar de eventos culturais, fato que influencia negativamente.


• O fato do processo de formação está intimamente ligado aos primeiros rituais de iniciação, a presença do adulto no papel de estimular, despertar o interesse do leitor é importantíssima. As primeiras experiências geralmente acontecem nos contextos familiares.


• O processo de formação deve esta necessariamente vinculado a situações/experiências que despertem o seu gosto/ prazer pela leitura, daí a importância de ambientes geradores de praticas leitoras.


• Um fator prejudicial é o fato de muitos professores trabalharem apenas com fragmentos de textos literários, e mesmo quando são textos completos o objetivo principal é ensinar questões gramaticais.


• A forma de cobrança dos textos como: prazos para leitura, fichas de leitura, interpretações prefixadas, obrigação de ler o livro escolhido pelo professor ou escola, dentre outras fazem com que o texto literário seja entendido como uma obrigação e não como linguagem artística, impedindo que os alunos/leitores conheçam sua literalidade.


• O uso da literatura é imprescindível para tal formação, pois segundo Zilberman e Silva:


“Compete hoje ao ensino da literatura não mais a transmissão de um patrimônio já construído e consagrado, mas a responsabilidade pela formação do leitor. A execução dessa tarefa depende de se conceber a leitura não como o resultado satisfatório do processo de alfabetização e decodificação da matéria escrita, mas como atividade propiciadora de uma experiência única com o texto literário. A literatura se associa à leitura, do que advém a validade dessa. (...) A experiência da leitura decorre das propriedades da literatura, (...) Nesse sentido, o texto literário introduz um universo que, por mais distanciado do cotidiano, leva o leitor a refletir sobre sua rotina e a incorporar novas experiências” (1990, PP. 18-19)


• Outros fatores prejudiciais são a didatização e pedagogização da leitura feita pela escola. • Fator importante é a utilização de critérios no momento da seleção dos livros de literatura infanto-juvenil que serão utilizados no cotidiano escolar. Tais critérios devem buscar historias geradoras de sentidos, ampliadora da compreensão de mundo, estimuladora de experiências novas, e, sobretudo, desencadeadora de puro prazer.


• A falta de tempo do professor, a formação precária, principalmente no que concerne a Literatura, a falta de habito (pelo menos) de praticas leitoras, dentre outros, são fatores que dificultam a escolha dos livros, que em certos momentos acabam sendo escolhidos sem questionamentos do professor pela escola ou editoras de livros.


Os alunos não lêem, mas será que o professor lê? Parece-nos que, pelas suas próprias condições de vida (salário, tempo, regime de trabalho, família etc.), o professor, em termos de atualização através da leitura, vem sendo extremamente afetado e prejudicado. Dai, talvez a facilidade com que determinadas editoras fazem comercio direto dentro das escolas, burlando livrarias e bibliotecas e transformando seleção de obras em meros fator de “marketing” bem trabalhado. (Silva, 1993, p.62)


• Possibilitar a atuação dos alunos/leitores na escolha dos livros é um fator de extrema importância na formação da identidade do leitor, é parte integrante do processo de aprendizagem, autonomia, descoberta, alem de propiciar prazer e liberdade, porem com o auxilio e mediação do professor.


Depois o livro é indicado, não escolhido pelo leitor... Como uma única historia pode interessar a toda uma classe?...Por que não ampliar os horizontes, indo às livrarias ou bibliotecas e deixando cada aluno manusear, folhear, buscar, achar, separar, repensar, rever, reescolher, até se decidir por aquele volume, aquele autor, aquele gênero, que, naquele determinado dia, lhe desperta a curiosidade, à vontade, a inquietação??? (Abramovich, 1995, p.140)


• As condições desfavoráveis das bibliotecas de muitas escolas dificultam a formação do leitor, uma vez que estando mal equipadas para atender o publico alvo, e em certos casos sendo inexistente, deixam de ser ambiente gerador de leitura.


Por outro lado, como as bibliotecas escolares inexistem ou são pessimamente equipadas em termos de acervo, os interesses específicos das crianças quase nunca são atendidos. Desta forma, a leitura da maioria dos alunos restringe-se a “pitadas de decodificação” do livro didático, apostilas e/ou compêndios de literatura. Dai o habito da não-leitura ou da leitura do livro fino ser uma constante em nossas salas de aula. (Silva, 1993, p.62)


• O ato de ler deve ser compreendido na escola com uma atividade em si, como uma atividade livre, sem estar atrelado a qualquer obrigatoriedade, tarefa ou avaliação ortodoxa imposta pelo professor-currículo.Deve também, estimular a criticidade e a criatividade dos alunos/leitores.


Me parece que a preocupação básica seria formar leitores porosos, inquietos, críticos, perspicazes, capazes de receber tudo o que uma boa historia traz, ou que saibam por que não usufruíram aquele conto...Literatura é arte, literatura é prazer...que a escola encampe esse lado. É apreciar – e isso inclui criticar... (Abramovich, 1995, p.148)


• Deve-se oportunizar sempre diferentes gêneros textuais, a fim de que se familiarize e desenvolva maior competência na leitura.


• Deve-se trabalhar com a produção textual do aluno, sendo este também capaz de ser autor, estimulando assim a criatividade.


Uma das grandes indagações sobre a pratica leitora, formação do aluno/leitor é o que se deve incentivar, objetivar. Habito, gosto ou prazer pela leitura? Neste contexto, existem os que objetivam um, mas que sem se dar conta estão buscando outro.


Gosto segundo o Dicionário Aurélio é: prazer; critério, opinião; faculdade de julgar os valores estéticos segundo critérios subjetivos, sem levar em conta normas preestabelecidas. E este depende das visões socio-históricas e culturais de mundo, da realidade vivida, das vivencias.


Habito segundo Ruth Rocha é um ato mecânico, que se realiza sem refletir sobre o que se esta desenvolvendo, é como escovar os dentes.


Prazer segundo Roland Barthes é “Texto de prazer: aquele que contenta, enche, dá euforia; aquele que vem da cultura, não rompe com ela, está ligado a uma pratica confortável de leitura...” (p.49). Ler um texto com prazer é perceber suas nuanças, mesmo diante de um texto nao-literário, é perguntar sobre seus possíveis desdobramentos intertextuais.


Assim, segundo a concepção de leitura ampliada, um dos objetivos na formação do leitor é que este tenha prazer na leitura, para que assim esta possa ser uma constante em sua vida.


Para tornar os alunos bons leitores, para desenvolver o gosto e o compromisso com a leitura, a escola terá que mobilizá-los internamente pois esse é um aprendizado que requer esforço. Precisará fazê-los achar que ler é interessante e desafiador, algo que, conquistado plenamente, dará a eles autonomia e independência. E terá que oferecer condições favoráveis para as praticas – que não se restringem apenas aos recursos materiais disponíveis, pois, na verdade, todas as evidencias têm revelado que o uso que se faz dos livros e de materiais escritos é o aspecto mais determinante para a formação de leitores de fato. (Prado, 1999, p.84)

A MENINA QUE ODIAVA LIVROS

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